Tipos de piadas permitidas no Islam

Mentir é proibido no Islam?

É bem conhecido e estabelecido entre todos os muçulmanos que mentir é proibido em todos os casos; de fato, a natureza repreensível de contar mentiras e a proibição disso é algo com o qual todas as religiões concordam, e a aversão à mentira é algo profundamente enraizado na natureza humana sã, não importa qual religião a pessoa siga.

O que é exigido do muçulmano é ser verdadeiro em sua fala em todas as situações.

Allah, Exaltado seja, diz (interpretação do significado):

“Ó vós que credes! Temei a Allah e permanecei com os verídicos.” [At-Tawbah 9:119]

‘Abdullah ibn Mas’ud (que Allah esteja satisfeito com ele) narrou que o Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) disse: “A veracidade leva à retidão, e a retidão leva ao Paraíso. Um homem pode continuar a falar a verdade até que seja registrado junto a Allah como um orador da verdade. Mentir leva à maldade e a maldade leva ao Inferno. Um homem pode continuar a contar mentiras até que seja registrado junto a Allah como um mentiroso.” (Narrado por Al-Bukhari, 6094 e Muslim, 2607)

‘Abdullah ibn ‘Amr (que Allah esteja satisfeito com ele) narrou que o Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) disse: “Existem quatro características, quem as tem todas é puramente um hipócrita, e quem tem uma delas tem uma das características da hipocrisia, até que se livre dela: quando lhe é confiado algo, trai essa confiança; quando fala, mente; quando faz um pacto, ele o quebra; e quando discute, recorre a discursos obscenos.” (Narrado por Al-Bukhari, 34 e Muslim, 58)

A proibição de contar mentiras ao fazer piadas

A proibição de contar mentiras ao fazer piadas é comprovada na Sunnah:

Bahz ibn Hakim (que Allah tenha misericórdia dele) disse: Meu pai me contou que seu pai disse: Ouvi o Mensageiro de Allah (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) dizer: “Ai daquele que fala e conta mentiras para fazer as pessoas rirem; ai dele, ai dele.” (Narrado por Abu Dawud, 4990; classificado como autêntico por Al-Albani em Sahih Abu Dawud, 4990)

Também é encorajado abster-se de mentir quando fizer piadas:

Abu Umamah (que Allah esteja satisfeito com ele) narrou: O Mensageiro de Allah (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) disse: “Eu garanto um palácio nos arredores do Paraíso para aquele que se abstém de discutir, mesmo que esteja certo, e uma casa no meio do Paraíso para aquele que se abstém de mentir, mesmo quando está fazendo piada, e uma casa na parte mais alta do Paraíso para aquele que faz sua atitude ser boa.” (Narrado por Abu Dawud, 4800; classificado como autêntico por Al-Albani em Silsilat Al-Ahadith As-Sahihah, n° 273)

‘Abdullah ibn Mas’ud (que Allah esteja satisfeito com ele) disse: Não é certo mentir para valer ou de brincadeira, ou que qualquer um de vós prometa algo a seu filho e não cumpra a promessa. (Narrado por Al-Bukhari em Al-Adab Al-Mufrad, 387)

Tipos de piada no Islam

A piada, seja baseada na verdade ou em mentiras, tem muitos cenários:

• Quando a piada é baseada na verdade e não há mentira envolvida

O princípio básico em relação a esse tipo de piada é que ela é permitida, se for feita de vez em quando e o indivíduo não estiver brincando na maior parte do tempo, e não levar a desvios óbvios.

An-Nawawi (que Allah tenha misericórdia dele) disse:

“Os estudiosos disseram: O tipo de piada que não é permitido é quando alguém vai a extremos na brincadeira e persiste naquilo, isso provoca risos, mas, leva à dureza de coração, distrai as pessoas de se lembrarem de Allah, Exaltado seja, e de se concentrarem em seus deveres religiosos. Em muitos casos, também leva a ofensas e desenvolvimento de rancores, e mina a dignidade e o respeito. Quanto a piadas livres de tais elementos, é permitido, e é isso que o Mensageiro de Allah (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) costumava fazer. Ele (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) só costumava fazer isso em raras ocasiões, quando servia a um propósito, ou para confortar a pessoa abordada e deixá-la à vontade. Não há nada de errado nisso; ao contrário, é Sunnah e é encorajado, se for desse tipo.” (Al-Adhkar, pág. 377)

• Quando a piada é baseada em uma mentira

Esse tipo de piada é proibido, como visto no Hadith de Bahz ibn Hakim (que Allah tenha misericórdia dele) citado acima.

Shaikh Al-Islam Ibn Taimiyah (que Allah tenha misericórdia dele) foi questionado sobre alguém que conta às pessoas histórias que inventou, e todas elas são mentiras: isso é permitido?

Ele respondeu:

“Quanto àquele que conta histórias inventadas para fazer as pessoas rirem, ou para algum outro propósito, ele está desobedecendo a Allah e Seu Mensageiro. Bahz ibn Hakim narrou de seu pai, de seu avô, do Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele), que disse: “Aquele que fala e conta mentiras para fazer as pessoas rirem, ai dele, ai dele, então, ai dele.” E Ibn Mas’ud (que Allah esteja satisfeito com ele) disse: Não é certo mentir para valer ou de brincadeira, ou que qualquer um de vós prometa algo a seu filho e não cumpra essa promessa.

Se, no entanto, isso envolve transgressão contra o muçulmano, ou envolve dizer algo que vai contra os ensinamentos islâmicos, então é mais enfaticamente proibido. Seja qual for o caso, aquele que faz isso merece punição Shar’i [a critério do juiz] que o impedirá de fazê-lo. E Allah sabe mais.” (Majmu’ Al-Fatawa, 32/255-256)

Em Fatawa Al-Lajnah Ad-Da’imah (26/52), foi dito:

Pergunta: Se, por exemplo, contarmos uma mentira como uma piada, isso é proibido ou não?

Resposta:

“Sim, é proibido. Na verdade, é um pecado grave, mesmo que seja uma piada.

E Allah é a fonte da força. Que Allah envie bênçãos e paz ao nosso Profeta Muhammad e sua família e companheiros.” (Comitê Permanente de Pesquisa Acadêmica e Ifta. ‘Abdullah ibn Qa’ud, ‘Abdullah ibn Ghadyan, ‘Abd Al-’Aziz ‘Afifi, ‘Abd Al-’Aziz ibn Baaz)

• Piadas contando histórias, quando você não tem certeza se elas são verdadeiras, mas poderiam ter acontecido

O que parece ser o caso, com base nas ações de alguns estudiosos, é que esse tipo de brincadeira é permitido. Nos livros de alguns estudiosos, encontramos algumas histórias engraçadas que são atribuídas a pessoas que viveram séculos antes, embora seja difícil verificar as histórias. Mas, não há intenção deliberada de contar ou transmitir uma mentira, mesmo que o contador não faça um esforço para verificar a história e garantir que o que ele está transmitindo seja verdade.

Tipos de histórias engraçadas

Shaikh ‘Abd Al-Muhsin Az-Zamil (que Allah tenha misericórdia dele) disse:

“Histórias interessantes e engraçadas são de três tipos:

I.Histórias que sabemos serem verdadeiras. Não há nada de errado com esse tipo, desde que a história não contenha elementos proibidos, zombaria de outros ou calúnia. Deve estar livre dessas coisas. Se a história for permitida, não há reservas sobre ela, e se for algo que realmente aconteceu ou é mais provável que tenha acontecido, não há nada de errado com isso.

II.Histórias que são conhecidas por serem mentiras e não aconteceram. Não é permitido contar essas histórias.

III.Histórias sobre as quais não se sabe se aconteceram ou não. Não há nada de errado em contar essas histórias.

Por isso, o Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) disse: “Narre dos Filhos de Israel, sem reservas.” Entre as histórias que são narradas por eles estão histórias estranhas e surpreendentes que podem ter acontecido, então ele disse aos muçulmanos para narrarem a partir delas, e afirmou que em algumas das histórias que são narradas por eles há coisas que são ainda mais surpreendentes.

Abu Dawud (que Allah tenha misericórdia dele) narrou com um bom Isnad (cadeia de narração) que o Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) costumava narrar histórias dos Filhos de Israel após a oração do ‘Isha’, e ele não seria interrompido por nada, exceto pela oração obrigatória.

Isso destaca o fato de que ele (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele), às vezes, dirigia-se às pessoas por um longo tempo após a oração ‘Isha’.

Conforme observado acima, não há nada de errado em contar essas histórias sobre as quais não se sabe se aconteceram ou não, se não forem conhecidas como mentiras, como Ibn Kathir e vários outros estudiosos apontaram.

• Histórias imaginárias que os ouvintes sabem que são imaginárias e não aconteceram realmente

Se essas histórias divertidas são inventadas e contadas para servir a um propósito, como usá-las como um meio de ensinar e educar, e coisas do tipo, então vários estudiosos emitiram decretos (fatawa) afirmando que são permissíveis.

Shaikh Muhammad Rashid Rida (que Allah tenha misericórdia dele) disse:

“Com relação a essas histórias imaginárias, que são semelhantes às histórias de Maqamat [em prosa rimada] escritas por nossos estudiosos antepassados, que eram lidas em escolas religiosas e outras escolas, como a Maqamat de Al-Badi’ e a Maqamat de Al-Hariri... ele – ou seja, Al-Hariri – disse que não conheceu nenhum dos estudiosos da Ummah em seu tempo que proibisse tais histórias que são inventadas sobre animais, como o livro de Kalilah wa Dimnah e semelhantes. Pois, o propósito por trás delas eram exortações benéficas, e os detalhes da história nunca foram o propósito principal. Nunca ouvimos falar de nenhum estudioso depois dele que proibiu a leitura de seu Maqamat.” (Fatawa Al-Imam Muhammad Rashid Rida, 3/1091-1092).

Shaikh Ibn ‘Uthaimin (que Allah tenha misericórdia dele) disse:

“Se alguém quiser apresentar um exemplo ao contar uma história, como se dissesse: Vou contar a vocês o exemplo de um homem que disse isso e aquilo, ou fez isso e aquilo, e isso e aquilo aconteceu, e o resultado foi isso e aquilo, não há nada de errado com isso. Um dos estudiosos disse, sobre o versículo “E propõe, para eles, um exemplo: dois homens. Fizemos, para um deles, dois jardins de videiras e cercamo-los com tamareiras e fizemos, entre ambos, searas.” [Al-Kahf 18:32 - interpretação do significado]: Isso não aconteceu realmente, e no Alcorão diz: “Allah propõe um exemplo: um homem que pertence a sócios litigantes, e um homem que pertence, inteiramente, a um só homem. Igualam-se ambos, como exemplo? Louvor a Allah! Mas a maioria deles não sabe.” [Az-Zumar 39:29 - interpretação do significado]. Então, se alguém conta uma história e não a atribui a uma pessoa específica, mas é como se algo tivesse acontecido, e o resultado foi isso e aquilo, não há nada de errado nisso.

Mas, se ele a atribui a alguém e é falsa, então isso é proibido e é uma mentira. O mesmo se aplica se o propósito de contar a história é fazer as pessoas rirem, porque é narrado pelo Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) que disse: “Ai daquele que fala e mente para fazer as pessoas rirem; ai dele, então, ai dele.” (Liqa’ Al-Bab Al-Maftuh, 77/23)

Shaikh Ibn Jibrin (que Allah tenha misericórdia dele) foi questionado:

É comum entre alguns de nossos irmãos contar histórias interessantes que envolvem mentiras para fazer as pessoas rirem, e quando os aconselhamos [a não fazer isso], eles dizem: É permitido contar histórias interessantes se isso pudesse ter acontecido, mesmo que você não saiba se realmente aconteceu. Isso está correto?

Ele respondeu:

“A palavra traduzida aqui como ‘histórias interessantes’ é usada para se referir a histórias estranhas, e geralmente são coisas que aconteceram, mas podem ser imaginárias. O propósito disso é apresentar um exemplo, como Al-Hariri fez em seu Maqamat, e como outros fizeram quando escreveram livros contendo essas histórias interessantes.

Mas, é proibido contar mentiras com o propósito de fazer as pessoas rirem. O Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) disse: “Ai daquele que fala e conta mentiras para fazer as pessoas rirem; ai dele, ai dele.”

Porém, se o público sabe que isso é um conto imaginário e não aconteceu realmente, mas poderia ter acontecido, então é um aviso contra algo semelhante que poderia acontecer, ou está preparando as pessoas para tais eventos possíveis, então isso é permitido. E Allah sabe mais.”

O que pode ser entendido das respostas (fatwah) de Shaikh Ibn ‘Uthaimin e Shaikh Ibn Jibrin (que Allah tenha misericórdia de ambos) é que essa permissibilidade é restrita ao tipo de história imaginária que é contada com um propósito ou como uma lição, e não é sobre uma pessoa em particular. Se a história é inventada sobre uma pessoa em particular, ou é inventada apenas para fazer as pessoas rirem, então isso não é permitido.

Entre os estudiosos anteriores que tinham uma visão semelhante estava Ibn Hajar Al-Haitami Ash-Shafa’i (que Allah tenha misericórdia dele), que disse:

“Um Hadith autêntico diz: ‘Narrar dos Filhos de Israel, sem reservas’ e o relato que diz ‘Maravilhas ocorreram entre eles’ indica que é permitido ouvir essas histórias maravilhosas para entretenimento e não para qualquer outro propósito.”

Disto pode-se entender que é permitido ouvir histórias estranhas e maravilhosas, ou quaisquer histórias sobre as quais não temos certeza de que são mentiras, com o propósito de entretenimento. E mesmo que seja certo que seja uma mentira, mas o propósito é dar um exemplo, exortar e educar, como encorajamento à coragem nos discursos imaginários de humanos ou animais, ainda é permitido.” (Tuhfat Al-Muhtaj bi Sharh Al-Minhaj, 9/398)

• O que entendemos do que é mencionado na pergunta – É permitido fazer piadas dizendo palavras de zombaria, como quando através de seu tom de voz, uma pessoa indica que o que ela quer dizer é algo diferente do que ela está dizendo? – isso está se referindo a quando um homem diz ao seu amigo: Você tem isso e aquilo? E o amigo responde: Não, mas pelo seu tom de voz brincalhão, o questionador entenderá que o que ele quer dizer é sim.

Neste caso, se focarmos apenas nas palavras, então é uma mentira, porque não é o oposto de sim.

Mas, se olharmos para o que o ouvinte entende do contexto, pode não ser uma mentira, porque o significado que o ouvinte entendeu estava correto, e porque as palavras podem ter significados diferentes dependendo do contexto em que são ditas e da maneira como são proferidas. Então, por exemplo, a frase ‘O que é isso?’ é uma pergunta, mas uma pessoa pode, às vezes, dizê-la em um tom de voz particular do qual o que é entendido é espanto ou objeção, e coisas do tipo.

Semelhante a isso é o que foi narrado de ash-Sha’bi (que Allah tenha misericórdia dele), que um homem estúpido encontrou ash-Sha’bi e uma mulher que estava caminhando com ele, e ele perguntou: Qual de vocês é ash-Sha’bi? Ele disse: Ela é. Os estudiosos citaram esta história; foi mencionada por Adh-Dhahabi em Siyar A’lam an-Nubala’ (4/311), sem comentários.

A regra sobre este tipo de história não é clara, e não encontramos nenhuma visão acadêmica a respeito dela. O mais provável é que haja uma concessão permitindo este tipo, especialmente quando há outra indicação forte e clara para sinalizar o que se quer dizer, embora fosse melhor não narrar a história, para evitar um assunto duvidoso. O Profeta (que a paz e as bênçãos de Allah estejam sobre ele) disse: “O que é permitido é claro e o que é proibido é claro, e entre eles há assuntos duvidosos dos quais muitas pessoas não estão cientes. Quem se precaver contra os assuntos duvidosos protegerá seu compromisso religioso de deficiências e protegerá sua honra da calúnia, mas quem cair no que é duvidoso cairá no que é proibido, como um pastor que pastoreia seu rebanho em terras privadas; ele logo pastará nela…” (Narrado por Al-Bukhari, 52)

E Allah sabe mais.